Projetos que flexibilizam Estatuto do Desarmamento avançam no Congresso
CCJ do Senado deve analisar projeto que revoga o estatuto. Na Câmara, texto semelhante está pronto para ser votado. Propostas facilitam compra, posse e porte de armas de fogo.
Projetos de lei que tentam alterar e flexibilizar o Estatuto do Desarmamento, com regras menos rígidas para o porte de armas, têm avançado no Congresso Nacional nos últimos meses. Sancionado como lei federal em 2003, o estatuto limita a circulação e o porte de armas de fogo e munição.
Na Câmara, duas semanas após a Comissão de Segurança Pública
ter aprovado proposta que libera o porte de armas na área rural,
deputados da chamada "bancada da bala" se mobilizam para incluir na
pauta da Casa um texto que institui o “Estatuto do Armamento”, nos
mesmos moldes do projeto em discussão atualmente no Senado.
A proposta quase foi incluída no pacote de segurança pública que
começou a ser votado na semana passada no plenário da Câmara, mas o
grupo recuou diante do mal-estar gerado com os episódios recentes
envolvendo armas de fogo em escolas.
No início de novembro, um estudante de 14 anos atirou dentro de uma escola particular
em Goiânia. Na ocasião, dois alunos morreram e outros quatro ficaram
feridos. A arma utilizada no crime era da mãe do adolescente, que é
policial militar.
Em outro caso recente, uma estudante de 16 anos foi morta com 11 tiros dentro de um colégio estadual de Alexânia, no entorno do Distrito Federal.
A motivação teria sido uma rejeição amorosa. O suspeito do crime é um
rapaz de 19 anos, que, segundo investigações, juntou R$ 2,3 mil para
comprar o revólver e a munição.
“Achávamos que dava para colocar [o projeto] neste primeiro bloco de
segurança pública. Mas aconteceu o caso em Alexânia e isso já causou um
mal-estar para votar a liberação de porte de armas. Mas sempre vai ter
um fato que venha a mudar o pensamento da coletividade e temos que
passar por cima disso”, disse o deputado Laerte Bessa (PR-DF),
integrante da Frente Parlamentar de Segurança Pública.
Projetos
Relator da proposta em tramitação no Senado que revoga o Estatuto do
Desarmamento, o senador Sérgio Petecão (PSD-AC) pretende fazer a leitura
de seu relatório – favorável à revogação da atual legislação – nesta
quarta-feira (22).
A expectativa é de que, se isso acontecer, a votação será adiada por um
pedido de vista (mais prazo para analisar o caso). No entanto, Petecão
defende rapidez na análise da matéria e acredita que há chance de o
relatório ser aprovado ainda em 2017 no plenário do Senado.
“Quero dar a maior celeridade possível ao projeto. Neste momento, de muita violência, é uma matéria que merece uma atenção especial” (Sérgio Petecão)
Pelo projeto, o porte de armas fica liberado para maiores de 18 anos
que preencham os seguintes requisitos, mediante laudos e certificados:
- bons antecedentes
- capacidade técnica
- aptidão psicológica
Projeto semelhante, que também revoga o Estatuto do Desarmamento,
tramita na Câmara e pode ser incluído na fila de votações do plenário da
Casa a qualquer momento. O texto, que cria o “Estatuto do Armamento”,
também reduz a idade mínima para comprar armas, mas para 21 anos.
Para o deputado Laerte Bessa, o projeto estabelece critérios e, por eles, a liberação de arma não será “para qualquer um”.
“É um direito que a pessoa tem, principalmente, se o estado não tem
condições de dar segurança. Mas [pelo projeto] não vai ser qualquer um
que vai ter porte de arma. Não vai ser esculhambado, mas se a pessoa
cumprir os requisitos, terá autorização”, enfatizou.
Há ainda outros projetos que tramitam na Câmara voltados ao tema do
armamento. Um deles, por exemplo, concede porte para policiais
aposentados e reformados. Há também outros dois que possibilitam que
praças das Forças armadas e pilotos de aeronaves andem armados.
Alerta
O avanço de propostas que afrouxam o Estatuto do Desarmamento acende um
alerta entre entidades que acompanham o setor de segurança pública.
Coordenador do Instituto Sou da Paz, Felippe Angeli avalia que
propostas para flexibilizar o estatuto, em vigor desde 2003, têm
conseguido espaço porque são encampadas por grupos altamente
mobilizados, especialmente nas redes sociais.
Angeli cita pesquisas recentes segundo as quais pautas pró-armamento
não contam com o apoio majoritário da sociedade. No entanto, diz que as
crises dos últimos anos no país, incluindo a da segurança pública, geram
um sentimento de “desordem, caos e bagunça”. Nesse contexto, observa o
especialista, o discurso de “pôr ordem” se torna atraente.
“Esse grupo [apoiadores do armamento] talvez nunca se sentiu tão à
vontade para expressar seus sentimentos mais radicais com o advento das
redes sociais”, declarou Felippe Angeli.
"A hora em que chega alguém falando de ordem, elas se apegam. Então,
esses parlamentares surfam na onda de um grupo que é minoritário, mas
barulhento e extremante engajado", disse.