Os ecos políticos da condenação de Lula por Moro
A estratégia de Lula, do PT e de seus adversários para tirar proveito da decisão de Moro de condenar o ex-presidente a 9 anos e meio de prisão
A condenação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva deve
intensificar o embate entre direita e esquerda com vistas à eleição de 2018.
Mesmo envolvido em escândalos, Lula era, vale lembrar, 30% das intenções de
voto para 2018. Se as denúncias não só não o tiraram do páreo, como podem até
ter fortalecido seu discurso, como fica o candidato Lula condenado em primeira
instância? Uma coisa é certa: seus aliados e seus adversários estão convencidos
que quem criar a melhor narrativa sobre os fatos sairá vencedor.
De um lado, a esquerda deverá
fortalecer a ideia de que Lula sofre uma perseguição política por parte da
Justiça, especialmente do juiz Sergio Moro, responsável pela sua
condenação a 9 anos e 6 meses de prisão nesta quarta-feira. Dessa forma, o
discurso seria uma tentativa de criar simpatia com o eleitorado de forma que,
mesmo que o ex-presidente seja condenado em segunda instância e não possa ser
candidato, outro nome do mesmo campo político se capitalize politicamente para
assumir seu lugar. Não seria o primeiro “poste” eleito com o capital eleitoral
do ex-presidente.
A tarefa, claro, é pra lá de
complexa. No momento, para seus aliados, o mais importante é demarcar o
território. A presidente do Partido dos Trabalhadores, senadora Gleisi Hoffmann
(PR), disse que a condenação do ex-presidente por Moro é uma decisão
“eminentemente política”. O ex-senador Eduardo Suplicy escreveu em letras
maiúsculas que Lula foi condenado sem provas.
Outro expoente petista, o
senador Lindbergh Farias disse que o partido vai procurar órgãos internacionais
para “denunciar” a perseguição. “Não vamos aceitar um processo eleitoral sem
Lula. É fraude, é uma farsa, vamos denunciar internacionalmente […] a Justiça
brasileira sempre jogou do lado da elite, e sempre foi muito dura com os
movimentos sociais”, afirmou. O líder do PT na Câmara, deputado Carlos
Zarattini, reforçou o discurso. “Moro foi quem condenou, quem investigou, quem
denunciou e julgou”, disse.
Até aqui, o discurso de
perseguição vinha ajudando a fortalecer o ex-presidente – em pouco mais de um ano,
ele subiu de 17% para 30% das intenções de voto. Para o professor de Ética e
Filosofia na UNICAMP, Roberto Romano, a partir de hoje se intensifica a corrida
pela persuasão do eleitor. Dessa forma, considerando que 17% seria o chão para
Lula – já que atingiu esse patamar no pior momento para o PT, logo após o
impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff –, esses 13% estão em jogo para
esquerda e direita, Lula sendo candidato ou não.
“Essa parcela é um território a
ser conquistado por um lado ou por outro. Dada a situação de descrédito de
todos os políticos, é claro que quem for mais eficaz nesse convencimento vai
ganhar mais gente para 2018”, diz Romano.
Os adversários do petista vão
tentar bater o máximo possível na tecla da corrupção para que essa imagem cole
ao ex-presidente – é o primeiro ex-presidente a ser condenado na Justiça pelo
crime. “Claro que essa condenação vai prejudicar a esquerda [nas próximas
eleições]. Hoje o Lula reconhecidamente culpado por corrupção e pelo espaço de
tempo que temos, já é possível avaliar que dificilmente poderá concorrer às
eleições de 2018 porque será condenado em segunda instância”, diz o líder do
Democratas na Câmara, deputado Efraim Filho.
Do mesmo partido, o senador
Ronaldo Caiado (GO) exaltou a condenação. “Justiça sendo feita contra um
criminoso que tantos prejuízos trouxe ao Brasil com seu projeto de poder”,
disse. O risco deste discurso é trazer a corrupção para o centro da arena
política, com expoentes importantes de outros partidos, como o senador tucano
Aécio Neves, também envolvidos em escândalos. “Se o eleitor mantiver a imagem
de que é todo mundo igual, o Lula continua no páreo”, diz um analista político.
E Temer?
Para o presidente Michel Temer,
a condenação veio em boa hora porque tira um pouco dos holofotes de cima de
seus problemas. Isso não quer dizer que a folga será duradoura, muito menos
eficiente para impedir seu afastamento do cargo nas próximas semanas. “A
condenação é boa para o PMDB, pois promove um desvio de foco do presidente
Temer no momento”, afirma Renato Meirelles, fundador da empresa de pesquisas
Locomotiva.
Caso Temer seja absolvido na
Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) e mais tarde no plenário da Câmara, a
população pode interpretar o momento como uma situação onde o sistema foi
seletivo – mesmo que se tratem de decisões tomadas por órgãos diferentes, o
Judiciário e o Legislativo. Para Eloísa Machado, professora da faculdade de
Direito da Fundação Getúlio Vargas em São Paulo, trata-se da concretização do
áudio em que Romero Jucá definia o impeachment como uma operação para “estancar
a sangria”. Nesse cenário, a esquerda sai fortalecida, porque na atual crise de
perspectiva política da população, Lula é a última memória da população de um
presidente efetivamente melhorou a vida do povo.
“Se, por um milagre, o
presidente Temer sair incólume, qual vai ser o discurso geral da população?
‘Todos os políticos são corruptos e se safam, então por que o Lula foi
condenado?’”. Isso pode ser bom para a esquerda porque refletiria esse discurso
de perseguição. E o ex-presidente sabe se movimentar e tem essa capacidade de
se apresentar como vítima”, diz Romano.
Em condições normais, um
ex-presidente condenado por corrupção perderia força política a ponto de ser
carta fora do baralho para as próximas eleições. Mas o Brasil de 2017,
definitivamente, é um caso à parte.