segunda-feira, 26 de março de 2018

SEGURANÇA ZERO

Apontadas como suspeitas pela execução de Marielle, milícias atuam no Rio sem serem incomodadas

Grupos de ex-policiais, militares e agentes na ativa não foram confrontados, garantindo expansão dessa força paralela. Dois milhões de pessoas vivem em áreas sob seu controle

Uma eminência parda controla territórios no Rio de Janeiro onde vivem mais de 2 milhões de pessoas, segundo estimativas do portal G1. São as milícias, grupos formados por ex-policiais, bombeiros, militares, agentes penitenciários e também membros das forças de segurança ainda na ativa. A atuação destas organizações paramilitares voltou à tona após o assassinato da vereadora Marielle Franco (PSOL) e de seu motorista Anderson Gomes no dia 14 de março. Embora a polícia ainda não tenha identificado nenhum dos assassinos, o nível de profissionalismo da emboscada e as reiteradas críticas feitas pela parlamentar à atuação da polícia e à intervenção federal jogam a suspeita sobre grupos milicianos. Especialistas ouvidos pelo EL PAÍS afirmam que nas últimas décadas muito pouco foi feito para controlar estes grupos, que colocam em risco a democracia nos territórios em seu poder e já elegeram vereadores e deputados estaduais.
Estima-se que atualmente cerca de 160 comunidades no Estado do Rio estejam sob o controle de grupos paramilitares. O maior deles é o chamado de Liga da Justiça, criado no final da década de 1990 por Aldemar Almeida dos Santos e Ricardo Teixeira Cruz, conhecidos pelos apelidos de Batman e Robin. Os dois estão presos.
Até o momento, a intervenção federal não incomodou os milicianos. O grosso das operações do Exército no Rio teve como foco principal áreas dominadas pelo tráfico, principalmente pelo Comando Vermelho. Prova disso é que a comunidade escolhida como balão de ensaio pelas autoridades, a Vila Kennedy, na zona oeste, era palco de disputa entre o CV e o Terceiro Comando Puro. Para o sociólogo Ignácio Cano, da Universidade Federal Fluminense, o enfrentamento feito pelo Estado contra os grupos paramilitares foi insuficiente. “As milícias são um câncer no Rio. E embora tenham provocado resposta do Estado depois de 2008, foi insuficiente”, afirma o professor. “Quando o Estado age contra o tráfico ele lança mão de uma lógica militarizada de ocupação da comunidade. Mas com relação às milícias não ocorre isso: eles investigam, podem até prender alguns, mas não tem a lógica de retomada do território”.