quarta-feira, 28 de fevereiro de 2018

OS ADOLESCENTES E O CRIME

Hoje, resgatei um artigo jurídico onde se apresenta os "pós e os contra" a redução da maioridade penal, apresentado por dois juristas que suplantam o tema com nitidez e desenvoltura. A observação de que 'jovens' são recrutados para o crime organizado, não é mera expectativa, no entanto, uma realidade. Adolescentes matam pela 'impunidade' que os cercam, aliados a benefícios que a organização criminosa patrocina, muitas vezes, para toda a família. Em dois tempos, veremos o enfoque do debate trazido a baila pelos respectivos desembargadores, apresentando com regularidades seus pontos de vistas, dentro do meandro jurídico e social, convertido pela imprensa como uma celeuma quase que sem solução, onde, vertiginosamente a criminalidade praticada por adolescentes cresce a 'pulso' de galope, sem que ocorra um programa que leve ao conceito definitivo para sanar essa ferida social, onde todos tem a mesma culpa e os órgãos que deveriam atribuir condições para curar o "câncer" da violência praticada por jovens/adolescentes, afastam-se sem o menor pudor, deixando a sociedade a mercê da impunidade.

DIÁRIO DE PERNAMBUCOContraditórioVocê é contra ou a favor da redução da maioridade penal?

Publicação: 31/07/2016 03:00

A favor


 Bartolomeu Bueno
Desembargador do Tribunal de Justiça de Pernambuco, presidente da Associação Nacional de Desembargadores (Andes)


Tema polêmico e objeto de acirrados debates nos meios jurídicos e acadêmicos, nas organizações defensoras dos direitos humanos e pela população em geral é o da redução da maioridade penal dos atuais 18 para 16 anos de idade.

Bons argumentos são expendidos pelos que defendem a redução da maioridade penal. Além disso, a redução da maioridade penal tem o amplo apoio da população que sofre o aumento desenfreado da criminalidade. Recente pesquisa levada a efeito pelo Datafolha aponta que 87% das pessoas pesquisadas afirmam ser favoráveis à redução da idade de imputabilidade ou responsabilidade penal para 16 anos de idade.

Eu defendo a redução da maioridade penal desde os tempos em que exerci a judicatura de menores e depois de infância e juventude por mais de 12 anos na capital do Estado, por entender que o nível de informação e conhecimento dos adolescentes de hoje; o amadurecimento precoce em razão dos avanços da medicina e da boa alimentação, todo jovem de 16 de idade tem condições de compreender o caráter ilícito ou antijurídico de sua ação e de ordenar-se ou agir de acordo com esse entendimento. Portanto, ao assumir o risco de praticar o delito, na forma culposa ou dolosa, deve responder criminalmente pela sua conduta, recebendo a punição adequada e de acordo com sua capacidade de cumpri-la.

Outro bom argumento utilizado pelos defensores da redução da maioridade penal é a de que um jovem entre 16 e 18 anos de idade, alfabetizado, pode facultativamente se alistar como eleitor e votar em presidente da República, governador, deputados estaduais e federais, senador, prefeito e vereador, exercendo a plena cidadania, podendo inclusive praticar um crime eleitoral e não ser punido. Aliás, muitos adolescentes menores de 18 anos são frequentemente utilizados para fazer propaganda irregular no dia da eleição, tais como a entrega de panfletos e outros meios de publicidade política.

Mais um aspecto relevante é que um adolescente com 16 anos de idade pode ser emancipado pelos pais e fica apto a praticar todos os atos da vida civil, como se maior e capaz fosse. Ademais, nessa idade o jovem pode casar, e, em casando, torna-se capaz plenamente no âmbito das relações jurídicas, adquirindo a maioridade pelo matrimônio, podendo inclusive ferir ou matar o cônjuge sem responder criminalmente pela sua ação.

É de ser realçado, ainda, que o adolescente infrator, ao praticar qualquer ação que se encaixa na moldura típica penal, está praticando um ato infracional correspondente ao crime, mas só será internado se praticá-lo com violência contra a pessoa. Essa internação não pode ultrapassar, provisoriamente 45 dias, e, depois de julgado, três anos, sendo obrigatoriamente reavaliado a cada seis meses para fins de progressão da medida sócio educativa - para um regime semiaberto, aberto, ou de prestação de serviço à comunidade.  

Ou seja, é totalmente impunível quando o menor pratica crimes considerados hediondos, como por exemplo, o tráfico de entorpecentes, que, a toda evidência, não há violência contra a pessoa.


Por fim, considerando, sobretudo, o aumento substancial da violência em decorrência da impunidade de menores de 18 anos, inclusive com o crescente numero de assassinatos de menores infratores por grupos de extermínio, eu digo SIM à redução da maioridade penal de 18 para 16 anos de idade.

Contra



 Luiz Carlos de Barros Figueirêdo
Desembargador coordenador da Infância e Juventude do TJ-PE


Desde que ingressei na magistratura, em 1982, que ouço propostas para reduzir a idade da imputação penal. Quase sempre depois de um caso isolado de delito grave praticado por adolescente, ou para servir de biombo e retirar o foco da mídia dos delitos dos poderosos. Agora, pelo menos, ao que parece, nem se trata de comoção social, nem de esconder as “tenebrosas transações”, até porque escancaradas com a lava-jato. A Câmara aprovou PEC para reduzir a idade de imputação para 16 anos, que aguarda pronunciamento do Senado, que, por sua vez, foi mais brando, aprovando PL no qual a redução é aplicável apenas em casos de delitos graves, o qual foi remetido à Câmara. A “opinião publicada” é amplamente favorável à PEC. Os especialistas são contrários à redução. O atual governo optou pela segunda alternativa, assumindo que não dá pra ficar do jeito que está. Com ela, atende-se ao reclamo da maioria, sem grandes conflitos com os estudiosos que tenderão a achar que foi um mal menor.

Resumidamente já se argumentou que: 1) O art. 228 da CR é cláusula pétrea; 2) Cadeia não conserta ninguém; 3) As unidades de internação em nada diferem dos presídios de adulto; 4) Frequentemente o tempo de permanência dos adolescentes autores de ato infracional nas unidades de privação de liberdade termina sendo maior que o dos adultos; 5) Em razão de tratados, como a Convenção de Nova York, é difícil para o Brasil se justificar perante a comunidade internacional acaso legisle sobre tal redução; 6) Os índices de reincidência de adolescentes infratores são infinitamente menores do que os dos adultos, especialmente se engajados em liberdade assistida e/ou prestação de serviços à comunidade; 7) Na cadeia, misturado a adultos, serão pós-graduados na escola do crime e sairão piores do que quando entraram; 8) O Brasil, é um dos países onde a responsabilização penal se inicia de forma mais precoce, aos 12 anos etc.

Em contrário, os favoráveis dizem que com 16 anos já podem votar, esquecendo que o Brasil é o único país do mundo onde ocorre tal aberração, e, assim mesmo, facultativamente; que em alguns países podem dirigir veículos automotores; que um jovem de hoje é muito diferente daqueles de gerações pretéritas, pois tem acesso fácil à informação, pela TV, internet, redes sociais etc.

É um fato que são mais informados, tal como eu o era em relação às gerações dos meus pais ou avós, só que a questão não é de informação, mas de MATURIDADE para discernir e se determinar segundo a circunstância concreta. Não é de saber se é errado ou certo. Até uma pequena criança faz esta distinção. É de se determinar e agir da forma correta, ainda que sob pressão de amigos, “tribos”, delinquentes mais velhos etc. Neste tocante, nada mudou. São tão imaturos e influenciáveis como os adolescentes do passado.

De outra banda, os contrários à redução são também intransigentes e não buscam entender que os reclamos só prosperam porque partem de um anseio legítimo. Não se trata de simples redistributivíssimo.

As pessoas estão cansadas de tanta impunidade. O sistema em vigor não tem dado respostas expeditas e eficazes. Além dos casos de violência tão explorados nos noticiários, o fato é que a população das cidades convive diariamente com pequenos delitos aquisitivos praticados por adolescentes, quase sempre contra idosos, crianças e mulheres e querem a resposta do estado.

Pessoalmente, por tudo o que foi dito antes, acredito que a verdadeira solução seria a manutenção da atual regra, mas reconheço que para tanto todas as vertentes do estado teriam que melhorar muito a sua atuação, tanto nas medidas socioeducativas em meio aberto, como no meio fechado e na agilização dos julgamentos. O Judiciário e o MP pernambucano realizam as audiências de apresentação no mesmo dia ou no subsequente à apreensão (“Justiça Sem Demora”) e “audiências concentradas” nas unidades de internação. Mas isso não acontece em todo o país e materializa o enfrentamento de parte do problema.

Não adianta simplesmente se dizer que a redução não resolverá o problema. É preciso que se apresentem alternativas palatáveis para que a sociedade volte a acreditar que o estado está cumprindo o seu dever de proteger a convivência social. É por isso que abomino a ideia da redução da idade de imputação, mas acho palatável que se majore o tempo de internação dos autores de delitos graves, como propõe o PL. Tal proposta é constitucional e idêntica ao modelo alemão. Mantém a imputação penal em 18 anos, como o faz a maioria esmagadora dos países, e pode vir a restaurar a credibilidade do sistema na população em geral, priorizando os aspectos pedagógicos sobre os meramente punitivos.