sábado, 6 de maio de 2017

O CALVÁRIO DE DIRCEU

Entenda a situação do ex-ministro José Dirceu em 5 perguntas e respostas

Supremo revogou prisão preventiva do petista, que terá de cumprir uma série de medidas cautelares; Dirceu poderá ser preso novamente caso TRF-4 mantenha condenação imposta por Moro.

ma das figuras políticas mais conhecidas no país, José Dirceu de Oliveira Silva, fundador do PT e ex-ministro da Casa Civil no governo de Luiz Inácio Lula da Silva, foi solto na última quarta-feira (3) sob críticas de investigadores e apoiadores da Operação Lava Jato.
Após 1 ano e 9 meses na cadeia no Paraná, ele obteve um habeas corpus do Supremo Tribunal Federal (STF) na terça (2) e foi liberado pelo juiz Sérgio Moro no dia seguinte sob uma série de restrições.
A decisão, da Segunda Turma do Supremo, foi interpretada por procuradores com um duro golpe nas investigações e é tida por muitos como uma nova fase da Lava Jato na Corte.
Mesmo assim, Dirceu poderá ser preso novamente, caso o Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4), sediado em Porto Alegre (RS), mantenha sua condenação em primeira instância.
Entenda abaixo toda a situação jurídica envolvendo o petista em cinco perguntas e respostas:
1. Por que Dirceu estava preso?
Na área criminal, existem basicamente dois tipos de prisão:
1.            De execução de pena, que só pode ser iniciada após uma condenação em segunda instância;
2.            Preventiva (ou provisória), decretada antes, para evitar fuga do país, prejuízo às investigações ou risco de novos crimes.
Quando foi detido pela Lava Jato em agosto de 2015, em prisão preventiva, Dirceu já estava em casa, fora do regime fechado, na execução da pena a que foi condenado no mensalão.
Para encarcerá-lo antes de uma condenação, em prisão preventiva, o juiz Sérgio Moro justificou que ele poderia voltar a cometer crimes, já que, mesmo após ter deixado o governo, em 2005, "teria persistido" em receber propina por contratos na Petrobras.
Depois, em maio de 2016, ao condenar o petista, o juiz renovou a prisão preventiva reiterando a possibilidade de novos crimes, já que ele também teria continuado a receber propina durante e após o julgamento e prisão pelo mensalão do PT, com pagamentos até outubro de 2014.
Apesar de já estar condenado por Moro, em primeira instância, Dirceu ainda não pode iniciar a pena na Lava Jato – que soma 32 anos e 1 mês – pois ainda não teve a culpa confirmada em segunda instância, em julgamento ainda a ser realizado pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4). Por isso, vinha sendo mantido na cadeia por decretos de prisão preventiva.
Em duas sentenças de Moro, Dirceu foi condenado a mais de 31 anos de prisão por corrupção passiva, lavagem de dinheiro e organização criminosa.
2. Por que ele foi solto?
Ao analisar a prisão preventiva, 3 dos 5 ministros da Segunda Turma do STF – Dias Toffoli, Ricardo Lewandowski e Gilmar Mendes – consideraram que o tempo de 1 ano e 9 meses na cadeia reduziu a capacidade de Dirceu, uma vez liberto, de voltar a cometer crimes, porque o grupo político sobre o qual tinha influência (o PT) já está fora do poder.
Os ministros também levaram em conta que, entre o último pagamento de suposta propina e a prisão, já havia se passado 10 meses.
“Os fatos que deram ensejo ao aventado risco de reiteração delitiva estão longe de ser contemporâneos do decreto prisional. Em consequência, por ter sido decretada muito tempo após a última intercorrência ilícita noticiada, o título [de prisão] não deve subsistir”, justificou Toffoli, autor do primeiro voto em favor da libertação.
Lembrando que não é possível iniciar a pena de uma condenação em primeira instância, Gilmar Mendes e Lewandowski chamaram a atenção para o tempo que Dirceu estava em prisão preventiva.
"Já se vão quase dois anos de prisão cautelar [preventiva] sem que haja previsão de julgamento da apelação. Não se pode impor ao paciente que aguarde preso indefinidamente”, disse Lewandowski.
Os três ministros que liberaram Dirceu entenderam que medidas alternativas à prisão – como monitoramento eletrônico – já seriam suficientes para evitar novos crimes. Assim, deixaram para o juiz Sérgio Moro a definição de quais restrições seriam necessárias.
A decisão da Segunda Turma poderá influenciar outros presos da Lava Jato, que pedem a extensão do benefício concedido pela Corte ao ex-ministro.
Até o momento, dois pedidos de extensão ao habeas corpus concedido a Dirceu já foram protocolados no Supremo. Os recursos foram apresentado pelos empresários Eduardo Meira e Flávio Henrique Macedo, que foram presos na 30ª fase da Lava Jato. Sócios da Credencial Construtora, eles são suspeitos de atuar na lavagem de parte do dinheiro desviado da Petrobras.
Todos os pedidos de extensão de benefícios serão relatados por Dias Toffoli.
3. Como ficará solto?
Dirceu deixou o Complexo Penal de Pinhais na última quarta (3) usando uma tornozeleira eletrônica. O monitoramento à distância foi uma das medidas alternativas à prisão determinada por Moro, que também incluem:
·                   Proibição de deixar a cidade de domicílio, no caso, Brasília;
·                   proibição de se comunicar com outros acusados ou testemunhas de ações penais a que responde na Lava Jato;
·                   comparecimento a todos os atos do processo e atendimento às intimações;
·                   proibição de deixar o país, com entrega de passaportes brasileiros e estrangeiros.
“Considerando que José Dirceu já está condenado a penas totais de cerca de trinta e dois anos e um mês de reclusão, há um natural receio de que, colocado em liberdade, venha a furtar-se da aplicação da lei penal. A prudência recomenda então a sua submissão à vigilância eletrônica e que tenha seus deslocamentos controlados. Embora tais medidas não previnam totalmente eventual fuga, pelo menos a dificultam”, escreveu Moro no despacho de soltura.
Dirceu não precisará ficar recolhido em casa o tempo todo nem precisou pagar fiança para deixar a cadeia.
4. Ele poderá ser preso novamente? Por quê?
Apesar de ter conseguido derrubar sua prisão preventiva, Dirceu agora poderá ser preso se o TRF-4, tribunal de segunda instância da Justiça Federal, confirmar uma das duas condenações já proferidas pelo juiz Sérgio Moro na primeira instância.
Só a primeira delas, no entanto, de maio de 2016, pela qual o ex-ministro foi condenado a 20 anos e 10 meses de prisão, já tramita no TRF-4, sob relatoria do desembargador federal João Pedro Gebran Neto.
Nesta ação, os advogados de Dirceu e outros sete réus já apresentaram suas alegações finais de defesa. O Ministério Público também já apresentou seu parecer, em 17 de janeiro, em favor da manutenção da condenação.
Caberá agora a Gebran Neto analisar os documentos e marcar o julgamento, a ser realizado na 8ª Turma da Corte, composta também pelos desembargadores Victor Luiz dos Santos Laus e Leandro Paulsen. A expectativa da defesa é que esse julgamento ocorra nos próximos meses.
Mesmo se a condenação for confirmada pela 8ª Turma, a defesa ainda poderá recorrer ao próprio TRF-4 para tentar virar o resultado.
Nesse caso, o julgamento é feito pelos mesmos desembargadores, além de outros dois: Sebastião Ogê Muniz e Márcio Antônio Rocha.
Segundo o advogado de Dirceu, Roberto Podval, o entendimento que tem prevalecido nos tribunais regionais federais é que só após o esgotamento de todos os recursos na segunda instância é possível dar início à execução da pena.
5. Se Dirceu for preso para cumprir pena, poderá sair em breve?
Se for mantida a pena de 20 anos e 10 meses de prisão de Dirceu, ele deverá ficar em regime fechado por pelo menos 3 anos, antes de progredir para o semiaberto, em que poderá deixar a prisão durante o dia para trabalhar.
O tempo pode ser maior caso ele sofra uma ou mais condenações em segunda instância ou se ele se comportar mal na penitenciária.
A defesa de Dirceu, porém, já estuda maneiras de evitar a execução da pena após a segunda instância, mesmo contrariando a permissão para isso.
No STF, por exemplo, ainda há ministros que entendem que a execução só é possível após o julgamento do caso pela própria Corte, na quarta e última instância.
Futuramente, se um recurso for sorteado para um desses ministros – como Celso de Mello, Ricardo Lewandowski e Dias Toffoli, por exemplo, contrários à prisão após a segunda instância – é possível que eles contrariem o entendimento da Corte para deixar Dirceu recorrer em liberdade.
Cronologia
·                   9 de outubro de 2012 - STF condena José Dirceu por compra de votos no mensalão
·                   15 de novembro 2013 - Dirceu se entrega à prisão após STF negar recursos contra condenação
·                   2 de julho de 2014 - Dirceu deixa o regime fechado na Papuda para trabalhar fora da cadeia
·                   4 de novembro de 2014 - Autorizado pelo STF, Dirceu é liberado para cumprir pena em casa
·                   3 de agosto de 2015 - Dirceu é preso na Operação Lava Jato
·                   18 de maio de 2016 - Dirceu é condenado pelo juiz Sergio Moro na Lava Jato
·                   17 de outubro de 2016 - STF perdoa e extingue pena de José Dirceu no mensalão
·                   08 de março de 2017 - Moro condena Dirceu pela segunda vez na Operação Lava Jato
·                   2 de maio de 2017 - Segunda Turma do STF manda soltar José Dirceu