Procuradores
suspeitam de ação de Temer e Loures em favor de empresa portuária
Decreto sobre concessão de áreas portuária interesssaria
à Rodrimar. Assessoria de Temer negou irregularidades. Empresa negou ter sido
procurada para pagar propina.
Numa conversa gravada entre presidente Michel Temer
e o deputado
afastado Rodrigo Rocha Loures (PMDB-PR) levantou suspeitas
sobre um decreto para o setor de portos.
Os procuradores acreditam que a empresa Rodrimar,
alvo de busca e apreensão na operação Patmos, pode ter sido beneficiada.
A assessoria de Temer e a empresa negam
irregularidades (leia mais ao final destta reportagem).
O nome da Rodrimar surgiu no meio das investigações
feitas a partir da delação da JBS na Operação Lava Jato. A empresa é
especializada em comércio exterior, atua no setor de portos, com base em
Santos.
Um dos executivos, Ricardo Mesquita, apareceu no
café onde o deputado afastado Rodrigo Rocha Loures se reunia com o executivo da
J&F, Ricardo Saud.
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Ricardo Saud: Oi, cara! Uai... Rapaz, você tá parecendo um boyzinho, veio. Tudo
bom?
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Ricardo Mesquita: Tudo bom, cara?
Em depoimento, Ricardo Saud falou sobre o encontro,
como mostrou uma reportagem publicada nesta quinta-feira (25) pelo jornal
"Folha de S.Paulo" e confirmada pelo Jornal Nacional.
"O Rodrigo pegou e falou: 'Ó, esse é o seu
xará, você sabe, tô cansado de saber. Nós fomos lá quantas vezes quando nós
estávamos fazendo negócio, o Temer sempre ajudou a gente. Tá bom, depois quero
te falar sobre ele, tudo bem? Tudo bem, falei, tchau, tchau fui embora a
operação acabou aí", disse Saud na delação premiada.
O procurador quis saber mais detalhes. E Saud citou
o nome de um sócio da empresa que, segundo ele, seria muito amigo de Michel
Temer, Antônio Celso Grecco.
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Procurador: Só pra deixar claro, não foi um encontro fortuito, ele estava ali para
fazer uma reunião com o deputado Loures?
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Saud: Eles são muito amigos. E o Celso, da Rodrimar, é muito amigo do
Temer, há muitos anos.
Saud contou também que, num segundo encontro, Rocha
Loures ofereceu Ricardo, da Rodrimar, para ser o intermediário da propina que a
JBS estava oferecendo.
Loures: Eu até pensei... Lembra aquele dia que nos
encontramos, tomamos um café, que a gente encontrou com seu xará?
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Saud: O Ricardo.
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Loures: Essa, esse era um horário... (inaudível)
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Saud: Com o Ricardo?
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Loures: Isso, aí ele poderia fazer... (inaudível)
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Saud: Tranquilo. Aí eu não queria... Ver se fazia com ele lá na JBS, talvez
na escola, não.
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Saud: Eu gosto muito dele.
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Loures: (inaudível) Vocês trabalham juntos? ...vocês se encontrarem... Uma
coisa natural.
Segundo investigadores, por causa dessa suspeita de
que a empresa poderia ser usada para receber dinheiro de propina, a Rodrimar e
Rodrigo Rocha Loures podem ser alvo de um novo inquérito.
As suspeitas aumentaram porque em um telefonema com
Rocha Loures, no dia 4 de maio, gravado com autorização judicial, Michel Temer
fala sobre um decreto que altera regras para a concessão da exploração de
portos, decreto assinado dias depois. E que, em tese, poderia beneficiar a
Rodrimar.
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Loures: Tá bom, presidente?
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Temer: Tudo bem e você, bem?
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Loures: Tudo. Tudo bem. Não, só para lhe fazer uma consulta. Agora, coisa de
umas horas atrás chegou uma informação, através do senador Wellington, que já
teria sido assinado o decreto dos portos, não sei se é verdade ou não.
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Temer: Não
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Loures: Pediu para eu verificar, é
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Temer: Não, não foi.
Mais à frente, na conversa, Temer e Rocha Loures
falam do artigo que poderia beneficiar a Rodrimar:
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Temer: Aquela coisa dos setenta anos, lá pra todo mundo, parece que está
acertado aquilo lá....
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Loures: Não. Isso equacionou, isso equacionou. Aí tinha uma interpretação dos
"pré-93" que ainda havia dúvida...
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Temer: Ah, bom. Essa daí que eu não sei. Eu não sei como é que ficou viu?
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Loures: É...Mas eu vou...
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Temer: Dá uma olhada com o Gustavo, com o pessoal lá.
Depois de falar com o presidente, Rocha Loures
ligou para Ricardo, da Rodrimar, e o informou sobre o andamento da proposta.
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Loures: Foi o que, foi o que...falei com o presidente e o presidente me deu
essa notícia de que ele não assinou nada.
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Ricardo: Tá.
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Loures: É que a ideia é fazer um ato na quarta-feira da semana que vem.
Ricardo, da Rodrimar, ainda elogiou a atuação de
Rocha Loures no assunto.
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Ricardo: É isso aí, você é o pai da criança, entendeu?
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Loures: É... A ideia é que se o governo for tomar uma decisão, nessa ou
naquela direção...
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Ricardo: Tenha que ser valorizado, valorizado, né?
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Loures: Acho que a última oportunidade, viu Ricardo, de transmitir qual é a
realidade da economia e tem que ver.. Mas, enfim, falar a verdade sempre.
O texto do decreto 8.049 permite que as concessões
para exploração de portos sejam prorrogadas por mais 35 anos, até o limite de
70 anos, sem licitação.
A Rodrimar tem duas concessões em Santos. Uma delas
foi conseguida depois de 1993 e, portanto, poderia ser beneficiada parcialmente
pelo novo decreto, de acordo com especialistas da área.
A Rodrimar já foi citada em um outro inquérito
sobre Temer que correu no Supremo Tribunal Federal há alguns anos. Nele, Temer
foi investigado por suspeita de participar de um esquema de corrupção que
envolvia concessionárias do porto de Santos.
Segundo reportagem da "Folha de S.Paulo",
uma planilha entregue à PF registrava o pagamento de R$ 1,2 milhão em propinas.
Metade seria para uma pessoa identificada como "mt".
Em maio de 2011, no entanto, quando Temer já era
vice-presidente, o ministro Marco Aurélio Melo, do Supremo Tribunal Federal,
determinou que ele fosse excluído do inquérito, atendendo a um pedido do
Ministério Público Federal, que disse não ter encontrado provas contra ele.
A assessoria do presidente Michel Temer declarou
que o decreto dos portos passou por um debate amplo, antes de ser publicado,
como é comum e legítimo numa democracia. Afirmou ainda que os dados referentes
ao decreto são públicos e que, por isso, na conversa do presidente com o
deputado afastado Rodrigo Rocha Loures, não há o repasse de nenhum conteúdo
privilegiado.
A defesa do deputado afastado Rodrigo Rocha
Loures, do PMDB, disse que vai se manifestar num momento oportuno.
A Rodrimar afirmou que não há
qualquer relação de amizade do dono da empresa, Antônio Celso Grecco, com o presidente
Temer. A empresa não comentou o encontro do diretor Ricardo Mesquita com
Rodrigo Rocha Loures, mas negou que tenha sido procurada para uma negociação
sobre pagamento de propina.(Fonte: G1)